Gaúchos no Obelisco - Cyro Martins |
Estante do Autor - Ficção |
(...) O autor tomou o episódio do Obelisco para título, por julgá-lo simbólico do arrebatamento da época e triunfo revolucionário. Não pense o público que nesse romance de Cyro Martins só aparecem eventos políticos, Entremeada com os acontecimentos, há uma bela histõria de amor. Aliás, as miulheres estão muito bem representadas nesse livro, que, além do mais, evidencia as características da ficção de Cyro Martins: emoção poética, senso de humor e um vivo sentido de realidade. Carlos Appel ( In: Orelha do livro. Gaúchos no Obelisco. Porto Alegre,Movimento.3a.ed)
..................................................... Assomaram à sacada, rodeados de inúmeros outros políticos, João Neves, Flores da Cunha e Oswaldo Aranha. Vivas, punhos erquidos, gritos esganiçados de abaixo o Cavanhaque! Na aflição do momento, a multidão não dava oportunidade aos oradores, por isso, somente depois de estender a mão espalmada pela quinta vez, Oswaldo Aranha pôde começar, lento, medindo as palavras, a fronte larga impondo-se à multidão. Após salientar que o país vivia uma hora histórica e não desejando que a massa saísse desapontada dali, o tribuno exclamou: "Mais hoje, mais amanhã será vingada a morte de João Pessoa!” Delírio. O povo pedia armas. Passaram-se mais de cinco minutos até que o orador seguinte pudesse se dirigir aos manifestantes. Era Flores da Cunha que aparecia. Ovacionadíssimo. "Confiamos na tua espada, Flores da Cunha!" "O bravo de Ibirapuitã mais uma vez montará a cavalo para lavar a honra ultrajada do Rio Grande!” De voz embargada, ele disse o que pôde, no momento: breves frases candentes, que não deixavam dúvidas quanto às intenções dos líderes da Frente Única a respeito do iminente levante armado, honrando, assim, os compromissos assumidos com o povo brasileiro, muito em especial com os gaúchos. "Nossas promessas serão cumpridas!" - terminou, secamente. Foi a vez, então, de João Neves da Fontoura, o tribuno da Aliança Liberal no Congresso. Por mais que o parlamentar eminente quisesse se conter e medir suas palavras, o fluxo de emoções que emanava da multidão incontida o arrastou a um depoimento definitivo. "Estamos diante de um crime caracteristicamente armado sob a inocultável responsabilidade do poder central. Já que outros não podem manter a ordem republicana, frente aos desmandos do Catete, a nós, rio-grandenses, cabe fazê-lo." A um velho maragato, porém ativo partidário da Frente Única, que se achava na periferia da manifestação, não soou lá muito bem aquela referência à "ordem republicana". Lembrou-lhe o famoso "Pela Ordem". "Sim, retrucou o companheiro do lado, eu me recordo, corno se fosse hoje, do editorial d' A Federação, botando água fria na fervura da reação republicana." Terminados os discursos, a multidão ainda ficou remanchando pela Praça da Alfândega, pelo Largo dos Medeiros, pela Rua da Praia, aos lotes, sem gana nenhuma de ir pra casa. Joãozinho Silveira sentia que tinha dado um salto de dez anos em poucas horas. Jamais esqueceria aquela noite. Era o que lhe parecia no momento. A noite mais sensacional de toda sua vida, aliás, não precisava muito para que assim fosse, tão pobre a sua vida! ..................................................... (Excerto de Gaúchos no Obelisco. Porto Alegre, Movimento, 1984, p. pág. 34-36.)
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