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Em desfile: a alma fronteiriça - Carlos Alberto Potoko | Imprimir |  E-mail

 

 

Lindo, lindo, o nosso desfile da semana farroupilha em Livramento juntamente com los hermanos do Uruguay. Tudo encantou, da abertura ao final, destaco a Banda Militar de Montevideo, Blandengue, a cavalo;  a tropilha “entablada” (com um tropeiro e uma égua madrinha a conduzir uma dezena de potros livres sem rédeas, só com um buçal) igual uma pata com seus patinhos, o reboleo dos ponchos dos nativistas uruguaios e seus cães cimarrom, os aplausos a incautos gaúchos, a disciplina dos seis mil cavaleiros e a organização. Se alguém tinha algum fiozinho de dúvida quanto ao investimento e apoio para este tipo de evento, agora já não tem mais, o caminho é este, e aí está um senhor evento turístico continental.

Nos galpões: abraços, sorrisos e apertos de mãos. No desfile: emoção de quem assistia e brilho nos olhos de quem passava, tanto a cavalo como nos carros temáticos. Enfim, nada era capaz de preencher nossos corações gaúchos com tamanha emoção. Mesmo sabendo-se das contradições da rebeldia farrapa, nada disso importa,o que importa é o nativismo como identidade de um povo valoroso, povo este que se recusa a ser engolido pela globalização, pelo contrário, ele é que está globalizando o mundo com os CTGS pregando sua identidade. Aliás, em matéria de identidade temos de exigir tudo o que temos direito.

O gaúcho é mais antigo que a divisão de fronteiras, onde há mais de 200 anos os espíritos livres dos Guaranis das Missões inspiraram os primeiros colonizadores com uma identidade em comum: da bombacha, do churrasco, da poesia e da canção em toda a região, por isso é chamada de “Pátria Gaucha”. O poncho, além de servir como adorno e proteção às intempéries, foi manta para a parturiente e sarcófago para o valente. O violão, sempre junto nas dores e na alegria, contrastava com a solidão do suicídio e a poesia. Na dança evocava espíritos da coragem, e para ser adulado, o chimarrão o esperava. Chimarrão este domesticado ao longo de 10.000 anos, como medicina do mate pelos Guaranis paraguaios, e  que no vento dos tempos se estendeu ao norte do RS, a Argentina e o Uruguay.É lógico que todos acabamos enfeitiçados por essa rica identidade, ela é a alma do nosso passado sem fronteiras, onde muitos gaúchos tombaram sonhando por essa liberdade: sem cerca, sem governo. Via-se apenas como um homem, com seus animais e a natureza. E assim  somos, um povo que vive e venera seu passado feliz sem fronteiras.


* Poeta de Santana do Livramento e pesquisador do projeto Fronteiras Culturais em LIvramento e Rivera, do CELP Cyro Martins